Hélio Pariz
Se você é um daqueles que há tempos anda inconformado com a música que ouve nas rádios e nos programas populares da televisão, é melhor não ler este artigo.
Se você é um daqueles que há tempos anda inconformado com a música que ouve nas rádios e nos programas populares da televisão, é melhor não ler este artigo.
É que na sua
última edição (nº 805, 28 de outubro de 2013, págs. 86-90), a revista
Época trouxe uma matéria interessante sobre a mudança no gosto musical
do brasileiro nas últimas décadas.
A pesquisa foi conduzida pelo Ibope, com o título “Tribos musicais", e foi realizada entre agosto de 2012 e agosto de 2013".
O universo investigado é grande: 20.000 ouvintes de rádio procedentes de todas as faixas etárias e classes sociais, que foram entrevistados nas capitais brasileiras.
A razão para se
eleger o rádio como, digamos, veículo-padrão do que se ouve no país é
que 73% da população brasileira afirma ouvi-lo com frequência, e esse
público se distribui da seguinte forma (as respostas são múltiplas):
- Música – 96%
- Notícias – 70%
- Esportes – 31%
- Humor – 21%
Logo, a
probabilidade de que o leitor deste blog seja um ouvinte assíduo de
rádio é muito grande, pelo que ele não se surpreenderá com os resultados
apresentados pelo Ibope.
Entre 2012 e 2013, cerca de 2/3 das músicas que foram tocadas nas rádios brasileiras pertenciam ao gênero sertanejo.
Thiago
Magalhães, assistente da pesquisa, conclui que “o que une todos é a
música. O Brasil é um país movido a música. Queiramos ou não, hoje ele é
movido a música sertaneja”.
Os antigos campeões de sucesso radiofônico, a MPB e o pagode, ficaram na poeira.
A música sertaneja responde por 65% do que as ondas sonoras levam ao público espalhado por todo o território brasileiro.
No distante segundo lugar está o pagode, que ocupa 19% da programação musical das rádios do país.
O funk desponta na terceira colocação, com 5% da preferência nacional. Na rabeira, com 3% cada um, estão o rock e a MPB.
A matéria da
Época traz a opinião do produtor e empresário Tom Gomes, que lista entre
as razões pelas quais o sertanejo suplantou os demais gêneros, em
especial a MPB, a sua flexibilidade e onipresença.
Por
flexibilidade, entenda-se a facilidade com que os músicos sertanejos se
adaptam a outras tendências regionais, como axé, pagode e forró, gerando
um certo Frankenstein conhecido por “pancadão”, por exemplo.
Já a
onipresença dos cantores sertanejos é sentida em todo o território
nacional, diz Gomes, para quem eles “são trabalhadores incansáveis.
Fazem shows diante de dezenas de milhares de pessoas todos os dias do
ano, ao passo que Chico Buarque faz um show a cada cinco anos para uma
plêiade de eleitos. Não admira que Paula Fernandes seja mais popular que
ele”.
Estranhamente, a
revista não questiona se uma das razões para esse domínio sertanejo é a
repetição exaustiva do gênero nos programas populares da TV. Talvez
porque a dona dela é a família Marinho, da Globo.
O “jabá”,
aquele gordo cachê que - dizem - gravadoras e produtores colocam na mão
de apresentadores e diretores de rádio e TV para promover determinado
artista, sequer é mencionado na matéria, talvez porque não seja de bom
tom tocar nesse assunto.
O artigo poderia ter sido, portanto, muito mais abrangente, mas há informações valiosas que merecem destaque.
Um dado
interessante sobre a divisão dos gêneros musicais no gosto do brasileiro
médio é que as tribos de fãs de um e de outro não são excludentes.
Desta maneira,
sertanejos e pagodeiros têm uma ótima relação entre eles. Enquanto 61%
dos primeiros ouvem pagode, 81% dos fãs deste curtem sertanejo.
Fãs de rock e
MPB pertencem às classes sociais mais altas e praticam o mesmo
intercâmbio entre esses dois gêneros, e a surpresa é que os adeptos do
funk e da música gospel têm uma relação bastante íntima.
O pesquisador
Magalhães chegou a uma conclusão curiosa: “a gente pode dizer que os
roqueiros ouvirão MPB quando ficarem mais velhos, assim como os
funkeiros que gostam de Anitta um dia ouvirão mais o gospel de Aline
Barros”.
Pois é, a maioria dos ouvintes de funk e gospel pertence às classes D e E e eles não chegaram a completar o ensino fundamental.
Os funkeiros se
concentram na faixa etária entre 12 e 19 anos, enquanto os religiosos
são mais facilmente encontrados entre os 25 e 34 anos de idade.
No Brasil,
lugar de funkeiro é no Rio de Janeiro e em Salvador, enquanto os fãs de
gospel têm suas trincheiras localizadas nas capitais nordestinas.
No intercâmbio entre os gêneros, 38% dos funkeiros apreciam música gospel, e 22 % dos religiosos ouvem funk.
Portanto, não deve demorar muito para que o funk invada mais igrejas evangélicas por aí. É só uma questão de tempo...
Para consolar
os saudosistas e defensores do bom gosto de plantão, talvez seja a hora
de cantar “apesar de você, amanhã há de ser outro dia...”
do Genizah
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