Rádio A Melhor do Universo

14 julho 2013

GOVERNO DOS EUA INCENTIVA COLEGA A DEDURAR COLEGA


por Heloisa Villela, de Nova York
Cômico? Eu quase morri de rir. Mas o assunto é sério e as consequências podem ser devastadoras. Começo da conversa na cozinha da minha casa: um amigo, funcionário do Instituto Nacional de Saúde, especialista em pesquisas de Alzheimer contou, indignado, a sabatina à qual foi submetido, no escritório, no horário de trabalho. Avisado de que seria entrevistado por um consultor a serviço do governo, ele já esperava o pior. Mas não esperava tanto.
A funcionária da tal empresa de consultoria não aparentava mais de 25 anos. Sentou-se diante dele disposta a vasculhar cada canto da vida profissional e pessoal do cientista. Ela não sabia com quem estava bulindo. As perguntas iniciais eram bastante ingênuas. Mas aos poucos ela foi se insinuando para a vida pessoal do funcionário público. Ele, que não é nada bobo, respondeu à altura.
– Para onde você viajou nas últimas férias?
– Essa informação é pessoal. Não tem relação alguma com o meu trabalho. Por isso, não vou responder. Quando saio de férias, faço o que me dá vontade. Saio para me desligar do trabalho.
A conversa foi adiante, nada amigável. Ele não cedeu um milímetro. Qualquer pergunta relacionada à vida pessoal foi respondida da mesma forma. “Não é da sua conta e da conta de ninguém”. No mínimo.

Mas essa é a exceção à regra. Os norte-americanos, em geral, respondem tudo e mais um pouco, sempre dispostos a abrir mão de qualquer rasgo de privacidade em nome da segurança coletiva. Nos últimos dois ou três anos, as perguntas se multiplicaram.
Agora, o jornal McClatchy publicou detalhes de um programa aprovado pelo presidente Barack Obama que, ao que tudo indica, é a origem do interrogatório ao qual o meu amigo foi submetido. Criado através de uma Ordem Executiva (uma espécie de decreto-lei), ou seja, decisão direta de Obama, ele se chama Programa de Ameaça Interna e entrou em vigor em outubro de 2011, logo após Bradley Manning ter copiado centenas de documentos secretos que foram entregues ao site WikiLeaks.
O Programa de Ameaça Interna exige que todos os departamentos do governo treinem seus funcionários para que reconheçam possíveis ameaças à segurança do país. O objetivo é fazer com que todo funcionário público passe a procurar um futuro Bradley Manning em seu departamento ou divisão. A ordem de Obama não se limita aos órgãos do governo que lidam com a segurança, com a espionagem ou com as Forças Armadas. Ela inclui os departamentos de saúde, de educação e até mesmo do chamado Corpo de Paz, os voluntários estadunidenses que se revezam em missões humanitárias em outros países.
Como preparar os funcionários públicos para tamanho desafio? Com uma lista do perfil de possíveis traidores. Eles ensinam: é preciso ficar de olho no estilo de vida do colega, possíveis problemas financeiros, horários de trabalho fora do padrão, viagens de última hora, divórcio. Um funcionário que, em média, copia 50 documentos por semana e, surpreendentemente, faz cópia de 100 documentos de uma hora para outra pode estar aprontando algo. Estes são alguns dos itens que fazem parte do “perfil psicológico” de um possível traidor.
O que é ainda pior no programa de Obama: o funcionário que perceber algo fora do comum e não alertar os superiores está  sujeito a processo e até mesmo punição com tempo de cadeia.
Maior empregador mundial, o governo americano tenta manter sob controle, na base do medo, os funcionários que têm acesso a todo tipo de informação. Que podem revelar ao mundo as entranhas de um poder que parece enfraquecido e, por isso mesmo, cada vez mais desesperado. O tal programa ficou a cargo de dois homens de confiança de Obama, o diretor de Inteligência Nacional, James Clapper, e o que ocupa o cargo erquivalente ao do ministro da Justiça, Eric Holder. Pelo visto, o país não tem muito mais com que se preocupar…
Como todo programa que existe neste país, há sempre o lado lucrativo. Segundo o jornal McClatchy, o Pentágono, as agências de inteligência e o Departamento de Segurança Interna gastaram milhões de dólares em projetos de pesquisa tentando definir uma lista de comportamentos típicos de futuros Mannings.
Logo após os ataques de 11 de setembro de 2011, o Departamento de Segurança Interna investiu US$ 878 milhões de dólares e contratou 2.800 pessoas com objetivo semelhantes ao projeto de Obama: traçar um perfil de possíveis terroristas interessados em embarcar nos aviões comerciais norte-americanos. Definir uma lista de comportamentos típicos de terroristas potenciais disfarçados de passageiros. Deu com os burros n’água. Jogou dinheiro fora. Enquanto isso, empregou muita gente.
Como o programa secreto de Barack Obama, que emprega empresas de consultoria para promover a espionagem interna em todos os órgãos do governo. O país pode perder. A relação de trabalho no funcionalismo público pode se tornar insuportável.
Só que no processo, alguém encheu o bolso de dólares.

do Viomundo

Nenhum comentário:

Postar um comentário