Eric Nepomuceno
O objeto de desejo, a obsessão de Obama
Encalhado em Moscou, sem ter para onde ir, Edward Snowden resolveu pedir asilo à Rússia. Será o primeiro passo para poder ir para um dos três países – a Nicarágua, a Venezuela e a Bolívia – que ofereceram asilo ao ex-técnico terceirizado da CIA que desmontou uma das grandes farsas do governo de Barack Obama.
por Eric Nepomuceno, em Carta Maior
Encalhado em Moscou, sem ter para onde ir, Edward Snowden resolveu pedir asilo à Rússia. Será o primeiro passo para poder ir para um dos três países – a Nicarágua, a Venezuela e a Bolívia – que ofereceram asilo ao ex-técnico terceirizado da CIA que desmontou uma das grandes farsas do governo de Barack Obama.
por Eric Nepomuceno, em Carta Maior
Mais enrolada que rocambole de avó ou bolo de rolo de Pernambuco, a
situação de Edward Snowden continua atraindo as atenções de meio mundo.
Encalhado em Moscou, sem ter para onde ir, ele resolveu pedir asilo à
Rússia. Será o primeiro passo para poder ir para um dos três países – a
Nicarágua, a Venezuela e a Bolívia – que ofereceram asilo ao ex- técnico
terceirizado da CIA que desmontou uma das grandes farsas do governo de
Barack Obama.
Empenhando uma palavra cada vez mais carente de valor, Obama havia
assegurado que desmantelaria o gigantesco esquema de espionagem global
armado pelo seu antecessor, George W. Bush. Pois não só manteve como o
expandiu.
Escudado no argumento da necessidade de evitar atentados terroristas,
seu governo aproveitou para espionar a tudo e a todos. Até agora tem
gente se perguntando como é que informações criptografadas trocadas
entre a representação da União Européia em Washington e sua sede em
Bruxelas poderiam conter dados que atentassem contra a segurança dos
Estados Unidos. Isso, para não falar de espionagem contra empresas,
bancos e cidadãos de todo o mundo.
Uma ação de tal envergadura, e feita com tal descaramento, oculta, na
verdade, uma atitude vil, impertinente, agressiva, típica da
prepotência imperial que Obama parecia disposto não a eliminar, pois
seria impossível, mas pelo menos suavizar.
O que vemos agora é o avesso. Snowden revelou parte do que sabe, e
essa parte foi suficiente para que ele se tornasse uma obsessão para
Obama, que desandou a distribuir ordens e determinações com a
tranqüilidade de quem não só se crê, mas está convicto de ser o
verdadeiro dono do mundo.
Há, evidentemente, um preço político e diplomático altíssimo a ser
pago por essa obsessão. Mas Obama parece disposto a pagar o que for.
Para começo de conversa, é preciso impedir que Snowden continue
gotejando informações. Além disso, é preciso impedir que outros jovens
técnicos em computação resolvam seguir seu exemplo e difundam métodos
que invadem a privacidade da cidadania e violam uma seqüência de
garantias asseguradas pela própria Constituição dos Estados Unidos, para
não mencionar acordos e tratados e convênios internacionais.
Há, nos Estados Unidos, uma multidão – calcula-se que cinco milhões
de pessoas – fazendo trabalhos terceirizados para a Agência de Segurança
Nacional, com acesso a dados supostamente sigilosos. Quantos Snowdens
potenciais estão por aí?
Há outros aspectos: Obama precisa mostrar à opinião pública interna
que o poder de influência dos Estados Unidos continua intacto apesar de
seu governo errático.
Deve-se, a isso tudo, somar um dado essencial: a ação de Edward
Snowden deixou claro, e bem claro, que o sistema de espionagem dos
Estados Unidos é, além de invasivo, frágil.
Afinal, o jovem técnico era parte do sistema, e fez o que fez sem que ninguém se desse conta até tudo vir à tona.
No horizonte mais próximo paira a possibilidade de conflitos
diplomáticos sérios entre Washington e a América Latina, e também com a
Rússia. Obama, que se dedica a advertir quem se anime a dar asilo a
Snowden das graves conseqüências que esse ato poderá provocar,
desconhece limites.
O que Washington fez, com a servil cumplicidade dos governos da
França, Itália, Portugal e Espanha, ao forçar um pouso do avião do
presidente boliviano Evo Morales na Áustria, é só um vislumbre de até
que ponto Washington pode chegar.
Agora, foi a vez de Moscou receber a advertência: que nem se atreva a
servir de ‘plataforma de propaganda’ das denúncias de Snowden. Para
Obama, pouco importa que a Rússia seja peça chave da segurança global.
Enfrentar problemas com a América Latina, onde a influência
norte-americana, apesar de ter diminuído, continua imensa, não significa
nenhum obstáculo. Afinal, as relações com a Nicarágua, a Venezuela e a
Bolívia já não são nada boas.
Os Estados Unidos compram 900 mil barris de petróleo venezuelano por
dia. Isso significa um terço do total das exportações de petróleo do
país que ofereceu asilo a Snowden. A Bolívia conta com alguns benefícios
comerciais que Washington concede aos países andinos. E a Nicarágua, um
dos países mais pobres da região, conta com algumas preferências
comerciais outorgadas pelos Estados Unidos.
Nenhum dos três países parece disposto a priorizar esses eventuais
benefícios sobre seu direito a assumir uma decisão soberana e conceder
asilo a um perseguido político.
Enquanto continua nebuloso o panorama, resta uma pergunta entre
tantas: de onde tamanha sanha? Por que, afinal, Snowden se transformou
na obsessão, no verdadeiro objeto de desejo de Obama?
O enigma, talvez, nem seja tão intrincado assim. Obama, tido como
fraco e frouxo, precisa mostrar que é forte e decidido. É uma questão
interna. Os truculentos republicanos vivem dizendo que ele não é de
nada. E, talvez por não ser de nada, Obama resolveu fazer uma exibição
global de valentia. O custo, as conseqüências, nada disso importa.
O que importa é satisfazer a opinião pública e seu eleitorado. Que,
quando se trata de questões internas, até que é bem informado. Mas que
não tem noção do que acontece fora de seus condados, e justamente por
causa dessa ignorância olímpica acredita que o sentimento anti-norte
americano é, no fundo, uma tremenda injustiça da humanidade.
Há décadas o mundo não via caçada tão implacável a um fugitivo. Para
Obama, Snowden virou uma questão prioritária para a auto-estima de
alguém cada vez menos estimado.
Onde isso tudo vai parar, ninguém sabe. Mas o que sim, se sabe, é que
se alguma vez a imagem de Barack Obama na América Latina teve algum
peso, significou alguma esperança de mudança, por mais tênue que fosse,
agora se diluiu feito pó no oceano.
do Viomundo
do Viomundo
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