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31 dezembro 2024

SUICÍDIO ESPIRITUAL X REAL


Nesta última semana do ano de 2024, fomos surpreendidos por uma catástrofe. Sabemos que depressão e suicídio caminham bem juntos, decorrendo uma em função da outra. O que poderia ser um caso leve, era bastante sério. Grave, ao ponto da depressão se passar na mente de uma pessoa crente pentecostal, abaixo de 50 anos, em um cenário complexo e doloroso num emaranhado de sentimentos, conflitos espirituais, pressões emocionais e sociais. Onde o serviço de saúde, dentro das limitações, por sua vez buscou entender e interagir  nessa relação, mas destrinchar o motivo pelo qual o suicídio foi a causa da depressão, ainda é pergunta sem resposta. Tentar descrever, com empatia, o que a pessoa poderia  estar enfrentando. Isto é o que buscamos:


1-Relação entre depressão e suicídio X Culpa Espiritual e Crise de Fé

Nesta matéria, buscamos entender  o que acontece na cabeça de uma pessoa ativa na obra de Deus, com cargo relevante na congregação, família organizada e equilibrada, encarando a depressão e tendo relação direta com o suicídio.
Na psicanálise clínica, há fartura de materiais que confirmam existir  uma relação entre depressão e suicídio. Haja visto, uma pessoa ter depressão, e não passa por tratamento completo e constante, ela pode ceder aos pensamentos suicidas. No entanto, suicídio não é apenas consequência da depressão enquanto doença. Transtornos também enfrentam ideação suicida, que é o pensamento em suicídio.

Assim surge a indagação: como ocorre uma situação com uma pessoa crente pentecostal com responsabilidades na Congregação? Do ponto teológico, as Escrituras Sagradas trazem relatos de homens e mulheres  da fé com depressão e o tratamento que passaram como: (Moises, Elias, Noemi, Saul, Davi, Jó, Jeremias, Jonas, Judas Iscariotes,...). com o  suicídio ou desejo da morte, andando próximo da depressão. Nenhum cristão está imune a tal situação. Depressão é uma doença, e o nosso corpo está sujeito a doenças físicas e também mentais. 

Jesus vai dizer que no mundo nós teríamos aflições este em forma de  cansaço espiritual, físico e mental. Dessa forma, a depressão atinge a pessoa quando a mesma está sofrendo. Por ser um doença patológica, precisa ser tratada como qualquer outra. Ser cristão não quer dizer ser imune, é preciso saber separar isso, mesmo com   a fé desempenhando um papel central na sua vida, mas com a pressão muitas das vezes sem ser suportada, por conta de outros fatores. No entanto, a depressão muitas vezes também distorce a percepção de si mesma e de sua relação com Deus. Assim acabam pensando  que morrer é a única saída possível para os problemas que enfrentam.  A pessoa pode estar sentindo:

  • Culpa por não ser "forte o suficiente" espiritualmente: A depressão pode ser erroneamente interpretada como uma fraqueza de fé, ou até mesmo como uma punição divina. Ela pode pensar: "Se eu fosse mais fiel, Deus me ajudaria", ou "Por que Deus me abandonou se eu sirvo a Ele?"
  • Vergonha por não corresponder às expectativas da igreja: A comunidade pentecostal valoriza muito a vitória espiritual, e ela pode sentir que sua luta interna a torna uma pessoa "menos crente". Isso pode levá-la a se esconder ou isolar ainda mais.
  • Medo de condenação eterna: O suicídio é visto como um pecado grave. Ela pode estar lutando com o pensamento de que Deus não a perdoará.

2. Pressões Financeiras e Conflitos Práticos

A pressão financeira pode causar depressão, pois a saúde mental e as finanças estão diretamente relacionadas: podendo causar estresse, ansiedade e desesperança.  A insegurança financeira pode diminuir a autoestima e a sensação de controle sobre a vida. Afetando negativamente as relações interpessoais, levando a conflitos familiares, isolamento social e sentimentos de vergonha e inadequação.  A pressão financeira pode ainda impactar a saúde física, provocando insônia, dores de cabeça, hipertensão, entre outros malefícios.

A situação só piora quando há o envolvimento ainda mais perigoso, com busca por empréstimo a juros exorbitantes e com ameaças,  pode ser resultado de um desespero financeiro. Talvez tenha recorrido por falta de outras opções, daí a pessoa se vê presa em um ciclo de medo e angústia:

  • Medo constante de represálias: A pressão de um agiota pode ser devastadora, com ameaças diretas ou indiretas que aumentam seu estresse e sensação de impotência.
  • Vergonha de admitir a situação: Por ser uma pessoa taxada  de ter fé, há o medo ou vergonha de pedir ajuda, temendo o julgamento da congregação ou o rótulo de irresponsável.
  • Sentimento de desamparo: As dívidas podem parecer uma prisão sem saída, especialmente quando combinadas com a depressão, que distorce sua capacidade de ver soluções. Isto tudo pode acontecer com qualquer mortal.

3. Solidão e Invisibilidade

Apesar de estar cercada por irmãos na fé, a pessoa pode se sentir terrivelmente só:

  • Falta de compreensão sobre sua dor: Muitas vezes, há falta de entendimento sobre saúde mental nas congregações. Associa tudo a falta de fé ou demônio. Vindo a ouvir repetidas frases como "É só orar mais", ou "Você precisa ter mais fé". Sem a menor empatia com a dor e só faz aumentar o isolamento.
  • Medo de ser julgada: A depressão e o suicídio ainda carregam estigmas, e ela pode temer ser vista como uma "vergonha" para a congregação ou sua família.
  • Falta de espaço seguro para expor seus sentimentos: Se ela acredita que não pode compartilhar sua angústia sem ser julgada, ela se fecha ainda mais.

4. Desespero e Ideação Suicida

O templo, que deveria ser um lugar de conforto e refúgio, pode ter se tornado o local onde se sente o peso máximo de sua dor. Suas motivações podem incluir:

  • Desejo de "se livrar da dor": A depressão  faz acreditar que o sofrimento nunca terá fim. O suicídio pode parecer, a única forma de escapar.
  • Conflito entre a fé e a desesperança: a pessoa  pode ter orado incansavelmente por alívio e, ao não sentir mudanças, pode acreditar que Deus não a ouve ou que ela não é digna de ajuda.
  • Escolha do templo como local: Isso pode ter um significado simbólico. Talvez a pessoa veja o templo como um lugar onde pode "se despedir" de Deus ou buscar perdão no último momento?! Ou, de forma trágica, pode-se estar tentando expressar sua dor de uma maneira que chame a atenção da congregação, ou dos que não entenderam ou foram causadores do sofrimento.

5. O Grito de Ajuda Não Ouvido

Por trás de suas ações, pode haver um grito silencioso por socorro que passou despercebido:

  • Sinais ignorados: Pode ter demonstrado sinais de depressão, como isolamento, mudanças de humor ou comentários sobre cansaço e desesperança, mas que foram subestimados ou mal interpretados.
  • Falta de suporte especializado: Talvez  nunca tenha tido acesso a ajuda psicológica ou psiquiátrica, seja por falta de recursos financeiros, preconceito contra terapia ou crença de que "só Deus cura".
  • Desejo de ser notada: O suicídio no templo pode ser, de forma inconsciente, uma tentativa de mostrar à sua comunidade a profundidade de sua dor.


Em suma a situação reflete o impacto devastador do estigma em torno da saúde mental, combinado com pressões espirituais e práticas. É uma tragédia que poderia ter sido evitada com acolhimento, compreensão e acesso a suporte profissional.

Na mente dessa pessoa, provavelmente havia um turbilhão de vozes conflitantes: a voz da fé, pedindo para resistir; a voz da depressão, sugerindo que não há saída; e a voz do desespero, gritando por ajuda. Seu ato final não é um reflexo só de fraqueza espiritual, mas do peso insuportável que se carregava só.

Isto nos lembra da importância de abordar a saúde mental nas denominações com empatia, quebrando tabus e oferecendo suporte real a quem está sofrendo.

A igreja ou denominação, enquanto comunidade de fé e apoio, tem um papel fundamental na prevenção de situações como essa. Embora seja impossível evitar todos os casos, algumas ações práticas, espirituais e de conscientização podem criar um ambiente mais acolhedor e preventivo.


A. Conscientização sobre Saúde Mental

A denominação pode desempenhar um papel importante ao tratar sobre questões de saúde mental, desmistificando a depressão e o suicídio:

  • Ensinar que depressão não é um fracasso espiritual: É essencial que os líderes reforcem que a depressão é uma condição médica e emocional, e não resultado de falta de fé ou pecado.
  • Promover palestras e treinamentos: Convidar psicólogos e psiquiatras cristãos (ou de confiança) para falar sobre saúde mental e como identificar sinais de alerta.
  • Distribuir materiais informativos: Folhetos, vídeos ou orientações sobre como lidar com a depressão e onde buscar ajuda podem ser disponibilizados.

B. Criar um Espaço Seguro e Acolhedor

Pessoas que enfrentam depressão ou pensamentos suicidas precisam sentir que podem se abrir sem medo de julgamento:

  • Treinar líderes para ouvir sem julgar: Pastores, diáconos e líderes devem ser capacitados a ouvir com empatia, sem minimizar a dor ou oferecer respostas simplistas como "basta orar mais".
  • Estabelecer grupos de apoio: Pequenos grupos ou ministérios específicos para acolher pessoas em sofrimento emocional podem criar um espaço onde os membros se sintam ouvidos e compreendidos.
  • Garantir sigilo: Muitas pessoas evitam se abrir por medo de exposição ou fofoca. A congregação deve garantir que tudo compartilhado será tratado com confidencialidade.

C. Encorajar o Acesso a Tratamento Profissional

A congregação pode desempenhar um papel crucial ao incentivar os membros a buscar ajuda profissional, desmistificando terapias e tratamentos:

 A Bíblia contém princípios que orientam sobre a relação entre a saúde, a fé e a medicina, e que podem ser aplicados a qualquer pessoa, independentemente do seu género.  Jesus disse que "os que têm saúde não precisam de médico, mas sim os doentes" (Lucas 5:31). A Bíblia afirma que a saúde faz parte do projeto de Deus, e que o médico deve colocar a sua ciência e habilidade a serviço da cura e da vida.  A Bíblia aconselha a honrar o médico, pois ele é necessário e foi criado pelo Altíssimo.  A fé funciona como um "elo" entre Deus e o ser humano no processo de tratamento e cura.  Jesus reconheceu que as pessoas doentes precisam de médicos, e enalteceu o talento e o serviço desses profissionais.

  • Reforçar que fé e tratamento médico caminham juntos: A liderança pode ensinar que buscar ajuda psiquiátrica ou psicológica não significa falta de confiança em Deus, mas sim usar os recursos que Ele disponibilizou. Jesus tinha Lucas (Médico) no Ministério.
  • Indicar profissionais confiáveis: A denominação  pode criar uma rede de contato com psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais que sejam confiáveis e acessíveis, inclusive com valores sociais para membros em dificuldade financeira.
  • Auxiliar financeiramente, quando necessário: Para pessoas com dificuldades econômicas, pode oferecer suporte financeiro ou buscar parcerias com ONGs e serviços de saúde mental gratuitos. Não é vergonhoso e sim essencial.

D. Identificar e Intervir nos Sinais de Alerta

A denominação deve estar atenta aos sinais de que alguém está em sofrimento emocional:

  • Observar mudanças de comportamento: Isolamento, desistência de cargos, desânimo constante, ou comentários sobre cansaço e inutilidade são sinais que não devem ser ignorados.
  • Perguntar diretamente: Não há problema em perguntar a alguém que demonstra sinais de depressão: "Você está pensando em se machucar ou tirar a própria vida?" Isso não incentiva o suicídio, mas abre espaço para diálogo.
  • Oferecer ajuda prática: Muitas vezes, pessoas em sofrimento não sabem como pedir ajuda. Assim pode-se oferecer apoio imediato, como acompanhar a pessoa a um psicólogo ou ajudá-la a resolver questões práticas (como até dívidas).

E. Acolher as Lutas Financeiras com Empatia

No caso de problemas financeiros e de envolvimento com agiota - oferecer  ajuda ao criar um ambiente onde os membros sintam-se a vontade e que podem pedir ajuda desde:

  • Educação financeira: Oferecer cursos ou palestras sobre planejamento financeiro pode prevenir situações de endividamento extremo.
  • Fundo de emergência: Criar um fundo para socorrer membros em dificuldades financeiras extremas, com critérios claros e justos.
  • Intermediação com credores: Em casos de dívidas graves, poder ajudar a buscar soluções, como renegociação, antes que a pessoa recorra a um agiota.

F. Fortalecer os Laços de Comunidade

A solidão e o isolamento são fatores que agravam a depressão. A denominação pode combater isso ao cultivar uma comunidade mais próxima:

  • Manter contato com membros ausentes: Se alguém começa a faltar aos cultos ou atividades, líderes podem entrar em contato para saber como a pessoa está.
  • Fomentar relacionamentos autênticos: Incentivar os membros a se preocuparem uns com os outros de maneira genuína, criando uma rede de apoio natural.
  • Valorizar a transparência emocional: A liderança pode dar o exemplo ao compartilhar, com humildade, suas próprias lutas, mostrando que é normal precisar de ajuda.

G. Orar e Agir

Embora a oração seja fundamental na fé cristã, é importante que ela venha acompanhada de ações práticas:

  • Ministérios de intercessão bem direcionados: Grupos de oração podem orar especificamente por membros que estão enfrentando desafios emocionais e financeiros.
  • Ação direta após a oração: A igreja pode se mobilizar para atender às necessidades práticas da pessoa, como visitas, ajuda financeira ou encaminhamento para tratamento. Afinal, fé sem obras é morta.

H. Combater o Estigma em Torno do Suicídio

O suicídio ainda é um tabu em muitos locais e nas denominações ainda maior, mas falar sobre isso abertamente pode salvar vidas:

  • Promover conversas francas sobre o tema: Pastores podem abordar o assunto em sermões ou estudos bíblicos, mostrando que a igreja é um lugar para acolher quem está em sofrimento.
  • Ensinar sobre o amor e a graça de Deus: Muitas pessoas que pensam em suicídio têm medo da condenação divina. Mostrar que Deus é misericordioso e deseja curar, não punir, pode ser libertador.


Enfim a Congregação tem o potencial de ser um lugar de cura e restauração, mas isso exige esforço consciente para ouvir, acolher e agir de forma empática. No caso dessa pessoa em estudo, talvez o desfecho pudesse ter sido diferente se ela se sentisse segurança para compartilhar sua dor, se houvesse menos julgamento e mais suporte prático.

A mensagem central de Jesus sempre foi de amor, cuidado e compaixão—e é exatamente isso que pessoas em sofrimento precisam. A congregação pode ser uma ponte para a vida quando se torna um refúgio de graça e suporte, tanto espiritual quanto emocional.

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